28 de outubro de 2006

O ovo e a galinha

Nos dias que correm, em todas as rodas de bate-papo, quando o assunto é política – principalmente a relativa à sucessão nos cargos eletivos – é comum dizer-se que “o povo não sabe votar, não sabe escolher seus representantes”. Fazendo ecoar antigos pensamentos, diz-se, até, que “cada povo tem o governo que merece”.
Sem embargos dos que assim pensam, ouso divergir dessas opiniões, cuja origem, imagino, remonta aos primórdios de nossa colonização, quando para parte dos indivíduos para cá enviados e para os que aqui já viviam era negado o beneplácito da “Coroa” em virtude de características ditas pessoais.
Ora, como é que o povo poderia saber escolher se, ainda hoje, lhe são apresentadas poucas opções? Como é que uma nação composta, em sua maioria, por famintos e por pessoas de pouca – ou nenhuma – instrução poderia discernir aqueles realmente comprometidos com a causa pública daqueles comprometidos apenas com a perpetuação de um estado de coisas que somente interessa às classes dominantes - sejam elas da “oposição” ou da “situação”? Enfim, como é que o povo poderia ser diferente se não lhe foi dada oportunidade para tanto? Impossível!
Um regime verdadeiramente democrático não se resume a dar ao povo o direito ao sufrágio, ao voto. O verdadeiro exercício da cidadania não consiste apenas em marcar um “x” em uma cédula ou apertar os botões de uma máquina. Antes de tudo, a concretização do Estado Democrático de Direito passa, necessariamente, pela criação de políticas públicas que, dentre outras coisas, permitam ao povo escolher seus representantes de acordo com seus reais anseios e necessidades.
Afigura-se absurdo e desrespeitoso obrigar o povo a escolher seus representantes somente entre aqueles considerados aptos pelas classes dominantes – repita-se, sejam elas da “oposição” ou da “situação” -, sobretudo porque essa oferta de possibilidades tem como finalidade precípua – e, às vezes, única – perpetuar o já citado estado de coisas.
É hora, portanto, de dar a todos o mesmo ponto de partida; é hora de dar a cada um o que lhe é devido; é hora de dar ao povo a chance de mudar sua história, seu destino.
Como nessa matéria não há consenso sobre o que é causa e o que é conseqüência, sobre o que veio primeiro – o ovo ou a galinha? –, que pelo menos se deixe aflorar a verdade segundo a qual o povo não é o responsável por suas mazelas.
* Juiz Mário Márcio de Almeida Sousa

2 comentários:

Ciro França disse...

parabenizo o Sr.Dr.Juiz de Direito Juiz Mário Márcio de Almeida Sousa por sua brilhante decisão no caso de São Mateus, sua determinação firme e responsável fez se cumprir a lei.

Anônimo disse...

EXCELENTISSIMO Dr. AMEI A MATÉRIA SOBRE CONCILIAÇÃO, ERA TUDO QUE EU ESPERAVA LER DE ALGUÉM. CONCORDO PLENAMENTE COM SUA POSIÇÃO DIANTE DESSE TEMA. PARA UMS SEM MUITA IMPORTÂNCIA, MAS, PARA OUTROS, UMA CONCILIAÇÃO MAU RESOLVIDA PODE FUTURAMENTE TRAZER A TONA AS SEQUÊLAS ADORMECIDAS COM MAIOR FUROR. UM ABRAÇO. PARABENS!