19 de junho de 2011

Adeus, amigo!

Em sua Carta a Lucílio, o filósofo latino Sêneca escreveu que “se é mesmo verdade o que os sábios nos dizem e se existe um lugar que nos acolhe (depois da morte), talvez o amigo que acreditamos extinto tenha apenas nos precedido”. Tolstoi, por sua vez, admitiu em Diários: “O único consolo que sinto ao pensar na inevitabilidade da minha morte é o mesmo que se sente quando o barco está em perigo: encontramo-nos todos na mesma situação”.
Embora seja um homem de muita fé e tenha forte crença na vida eterna, devo confessar que a ideia, digo, a certeza da morte me apavora. Por mais que me esforce, ainda não sou capaz de entender quando morrem crianças, mulheres grávidas e gente que passa a vida a ajudar os outros, por exemplo; principalmente quando esses eventos ocorrem de forma trágica ou cruel; e mais ainda quando vejo escroques relarem na morte e seguirem vivendo – muitas vezes às custas da desgraça e mesmo do perecimento alheios.
Minha linda mãe costuma me repreender quando digo que muita gente não deveria desfrutar do dom da vida, pois retira dos outros a oportunidade de uma existência digna e até mesmo a chance de sobreviver. Mas a vida é assim, dirão alguns. Ou melhor, a morte é assim. Afinal, todos morreremos: os bons e o maus. E o pior é que essa verdade jamais poderá ser questionada, como fui obrigado a lembrar recentemente.
Dias atrás, durante uma audiência - e por uma razão que ainda desconheço -, fugi da rotina e atendi uma ligação no celular. Era o meu velho e amado pai, com a voz embargada, a me contar que um querido amigo nos deixara. As lágrimas logo escorreram pela minha face. Deixei a sala de audiência. Voltei minutos depois, com os olhos ainda rasos d’água. E com o coração apertado terminei o ato. Já em meu gabinete, sozinho, não precisei mais me conter e deixei a emoção fluir. Foi então que me ocorreu uma grande dúvida. Como o sepultamento seria na manhã seguinte e na pauta havia treze audiências marcadas, o que deveria eu fazer? Desmarcar esses compromissos profissionais e ir à despedida ou ficar e seguir a agenda? Pedi então a Deus e ao meu amigo, agora um espírito de luz, que me ajudassem a tomar a decisão mais acertada.
Além de ser um homem prudente e sensato, meu amigo sempre me dispensou grande respeito e admiração, sobretudo quanto à minha atuação como juiz. Por diversas vezes o repreendi quando ele me conferiu predicados que ainda não alcancei - e talvez jamais o faça. Mas admito que me sentia muito lisonjeado, sobretudo diante do descrédito por que passa o Poder Judiciário – por culpa de uma minoria, não excede registrar. Como convivia muito com meu pai, é provável que meu amigo soubesse que a admiração e o respeito eram – e são – recíprocos, bem como os bons sentimentos, especialmente a amizade e o afeto.
E foram justamente esses sentimentos mútuos e verdadeiros que me fizeram decidir: eu deveria ficar e realizar as audiências, para não causar grandes transtornos às partes e aos advogados. Foi o que fiz. Hoje, com o coração mais confortado, tenho a convicção de que bem agi, pois rendi homenagens ao meu saudoso amigo honrando a toga que envergo, que tanto me orgulha e que ele tanto admirava. Também estou certo de que essa seria a sua orientação.
Fique com Deus, meu amigo Eliud Oliveira! Esteja certo de que tudo farei para continuar a merecer sua admiração e seu respeito. Que seu espírito de luz ajude a iluminar meu caminho, conduzindo-me sempre pela trilha da ética e da Justiça. Obrigado, por tudo. E até um dia. Até lá, espero jamais olvidar a lição do também filósofo Santayana: “Não existe cura para o nascimento nem para a morte, a não ser aproveitar o tempo entre eles”.
P.s.: Embora não o conhecesse pessoalmente, quero externar à família do Deputado Federal Luciano Moreira meu sincero pesar pelo seu repentino e absurdamente precoce falecimento. Decerto que a vida pública também perdeu muito. Que Deus lhes conforte.

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